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Juízes e advogados se reúnem no CCJF para debater riscos da proposta de unificação das Justiças do Trabalho e Federal

André Fontes (no púpito): “A Justiça do Trabalho vem sendo ameaçada porque cumpre a sua missão”
André Fontes (no púpito): “A Justiça do Trabalho vem sendo ameaçada porque cumpre a sua missão”

Para o presidente do TRF2, desembargador federal André Fontes, a Justiça do Trabalho “vem sendo ameaçada porque cumpre a sua missão”. O alerta foi feito durante o debate “Justiça do Trabalho e Justiça Federal juntas?”, organizado pelo Instituto dos Advogados do Brasil (IAB), na quinta-feira, 26 de julho. O evento foi realizado no Centro Cultural Justiça Federal (CCJF), no centro do Rio de Janeiro.

O fórum foi promovido para discutir os impactos sociais da eventual unificação dos dois ramos do Judiciário. A ideia vem sendo defendida por algumas frentes políticas, com o argumento de que a medida geraria economia para os cofres públicos. Quem advoga a unificação também costuma afirmar que, com a reforma trabalhista implementada em 2017, através da Lei 13.467, a Justiça do Trabalho não seria mais necessária.

Em sua fala, André Fontes destacou que os Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs) funcionam como “uma jurisdição de balcão”, ou seja, sua atuação se dá principalmente na audiência, quando juízes e partes ficam em contato próximo, sendo privilegiada a informalidade, a oralidade e a conciliação. A pressão que o palestrante classificou de “ideológica” para extingui-la existe porque ela é eficiente na composição dos conflitos entre patrões e empregados e, muitas vezes, conflitaria com os interesses do capital. O magistrado também disse que o debate sobre o tema é necessário, já que, embora não haja projeto de lei formalizado, a proposta pode ganhar corpo a qualquer momento.

Precarização da Justiça

No entendimento do desembargador, o risco da unificação seria a precarização da jurisdição, que ocorreria com a falta de estrutura, pessoal e orçamento. Ele lembrou que, antes da Constituição da República de 1988, havia defensores do fim da própria Justiça Federal e que isso só não aconteceu por conta da articulação dos seus membros com representações políticas e populares.

Por fim, o palestrante sugeriu que, se a questão é econômica, uma melhor solução seria ampliar a competência da Justiça do Trabalho, que poderia assumir as causas previdenciárias, como ocorre na Bélgica. Lá, explicou, a Justiça do Trabalho é integrada por duas instâncias, sendo a primeira exercida pelo Tribunal do Trabalho e a segunda, pela Corte do Trabalho. E a competência abrange as questões sobre seguridade social: “É mandatório que estejamos amplamente conscientes dos múltiplos e consistentes fatos que desaconselham a unificação. A Justiça Federal e a Trabalhista têm naturezas, princípios, histórias, propósitos, organizações, estruturas e composições díspares. Não há como fundi-las sem graves consequências para a sociedade”, concluiu.

 abertura do debate ficou a cargo da presidente nacional do IAB, Rita de Cássia Sant’Anna Cortez. A mesa do evento também foi prestigiada pela vice-presidente do TRT1 (Rio de Janeiro), desembargadora Rosana Salim Villela Travesedo, pelo presidente da Academia Nacional de Direito do Trabalho, João de Lima Teixeira Filho, e pelo presidente da Comissão de Direito Administrativo do IAB e professor da PUC-Rio Manoel Messias Peixinho. Todos palestraram.

Ainda, receberam a palavra os debatedores convidados juiz Otávio Amaral Calvet, presidente da Associação dos Juízes do Trabalho (Ajutra), juiz Ronaldo da Silva Callado, presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 1ª Região (Amatra1), e o juiz federal Flávio de Oliveira Lucas, representando a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe).

Fake news

Uma das exposições que tiveram destaque foi a de Manoel Peixinho, que criticou o discurso dos apoiadores da unificação, no sentido de que a especialização em matéria trabalhista seria típica dos sistemas judiciais de países em desenvolvimento. Ele chamou atenção para o fato de que, pelo contrário, países que são modelo de competitividade também adotam as separações entre os ramos do Judiciário.

O Reino Unido, por exemplo, conta com os Employment Tribunals (Tribunais do Emprego) para a primeira instância e o Employment Appeal Tribunal (Tribunal de Apelação do Emprego), para o segundo grau. Já a Alemanha, explanou o advogado, tem um sistema idêntico ao brasileiro, com três graus de jurisdição.

Manoel Peixinho disse que não se trata de casos isolados, mas de uma realidade que se reproduz em outros países, como Bélgica e Noruega. Ele acrescentou que a Inglaterra, inclusive, aboliu a cobrança de custas judiciais para as ações trabalhistas, com o fundamento de que seriam inconstitucionais e ofensivas ao Estado Democrático de Direito, por dificultarem o acesso do povo aos serviços jurisdicionais: “Precisamos combater esse tipo de ‘fake new’, que apregoa que Justiça do Trabalho é coisa de Terceiro Mundo”, conclamou.

Fonte: ACOI/TRF2