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Justiça Federal do RJ promoveu, em 20/10, webinário com o tema “Redução das desigualdades – Falando sobre o racismo estrutural”

Foto de Thiago Amparo, Aniele Xavier e Rosane Borges, todos sorrindo, durante o webinário
Justiça Federal do RJ promoveu, em 20/10, webinário com o tema “Redução das desigualdades – Falando sobre o racismo estrutural”
Foto de Rosane Borges com a seguinte legenda: "Rosane Borges falou sobre a dificuldade de reconhecer o racismo como pilar estruturante da sociedade brasileira"
Rosane Borges falou sobre a dificuldade de reconhecer o racismo como pilar estruturante da sociedade brasileira
Foto de Thiago Borges, sorrindo, com a seguinte legenda: "Thiago Amparo denunciou as "formas cínicas" do Direito para mascarar a questão racial"
Thiago Amparo denunciou as "formas cínicas" do Direito para mascarar a questão racial

Evento contou com a presença de articulistas do jornal A Folha de São Paulo e da revista Isto É.

 

Com o objetivo de promover uma reflexão sobre as sutilezas que indicam o fosso social entre brancos e negros e o papel das instituições brasileiras, como o Judiciário, na perpetuação do racismo, a JFRJ realizou, no dia 20/10, o webinário “Redução das desigualdades - Falando sobre racismo estrutural”.

 

O evento, promovido pela Coordenadoria de Capacitação e Desenvolvimento da JFRJ, teve a participação da doutora em ciências da comunicação pela USP e articulista das revistas Carta Capital e Isto É, Rosane Borges, e do professor de Direito da FGV e colunista do jornal Folha de São Paulo, Thiago Amparo. O webinário é a primeira ação educativa promovida pela SJRJ voltada especificamente para discutir o tema.

 

Rosane Borges abriu o debate defendendo que o Brasil está de tal forma mergulhado no racismo que é difícil dimensionar o tamanho do abismo social produzido por ele, cristalizado por meio das políticas públicas, pelo sistema de Justiça brasileiro e até por uma noção unívoca de estética. Para a especialista, um dos motivos que podem explicar essa resistência em reconhecer o racismo como pilar estruturante da sociedade está no mito de que o brasileiro é um povo agregador e que lida com os problemas de forma leve, na base da galhofa.

“Por um lado, isso é bom, mas por outro, o não enfrentamento do trauma adia um projeto de nação que precisamos repensar. Somos um povo hospitaleiro e alegre sim, mas também temos uma face violenta que nos constitui, e essa violência é o que desenha nosso pacto federativo”, afirmou.

 

300 anos de escravidão

 

Ao falar sobre a real dimensão da brutalidade da escravidão transatlântica, Rosane Borges explicou como esse ideário escravagista impregnou as relações sociais, promovendo a violação de corpos negros até hoje. “Foi um dos piores crimes contra a humanidade, porque tomou corpos a partir de um dispositivo racial. Essa também foi a única escravidão no mundo que, a um só tempo, destituiu corpos de uma maneira tríplice: fomos tomados como corpos-moeda, corpos-objeto e corpos-mercadoria. A percepção de corpos não brancos ficou associada à não humanidade”, disse.

A instituição de políticas afirmativas e de outras medidas a partir da perspectiva da luta antirracista também foram temas abordados pela pesquisadora. Para ela, combater as formas de exclusão pela raça não se trata de empatia, mas de humanidade.  “Reconhecer que somos racistas não é uma cortesia cristã para com os negros que sofrem, que estão à margem da sociedade, que são vítimas do racismo policial. Não é uma questão de empatia. No racismo, ninguém está protegido. Mesmo quem é privilegiado, perde sua humanidade, indicando que naufragamos enquanto pessoas, enquanto seres humanos e enquanto civilização”, defendeu.  

 

Direito racista?

 

A estrutura da Justiça e a aplicação do Direito podem colaborar na perpetuação do racismo? Para o professor Thiago Amparo, a resposta é sim. Uma das evidências, segundo o pesquisador, está na própria instituição da Faculdade de Direito, no século 19, destinada à elite branca e construída ideologicamente sobre bases racistas. “A gestação da Faculdade de Direito se voltou à constituição de um estado nacional fundado em teorias racistas e deterministas, marcadas por condenar pessoas pretas ou pobres. Algumas dessas teorias faziam acreditar que o local onde a pessoa nascia e crescia determinava sua condição de criminoso ou não, ideias que reverberam até hoje”, declarou.

O professor também afirmou que o Direito tem “formas cínicas” de silenciar a questão racial. Um exemplo disso é a Lei Antidrogas. “O fato de não haver um esclarecimento objetivo sobre o que significa traficante e usuário de drogas faz com que pessoas negras sejam facilmente enquadradas como traficantes, e não como usuários. Também há muitas formas de mascarar reinvindicações pela igualdade, como se fossem demandas calcadas em um ativismo, mas na verdade são reivindicações para que o Direito olhe essas violações e as enderece de forma justa e completa”, ressaltou.

Segundo Thiago Amparo, a própria formação do corpo funcional do Judiciário - marcado pela desigualdade racial de acordo com o último Censo do CNJ – também reflete o racismo. “Quando falamos para termos mais juízes e juízas, desembargadores, ministros e ministras negras na Justiça é porque o olhar a partir de diferentes experiências pode contribuir para que o Direito seja mais completo. É preciso incorporar no Judiciário um olhar que ataque a subordinação que as pessoas negras sofrem, tentando contribuir para que o racismo estrutural não seja recalcado, mas enfrentado”, destacou.

 

Iniciativas institucionais

 

Promover o debate sobre a questão racial, com um formato educativo, é uma forma de estimular a construção de novos conceitos, afirmou a coordenadora de Capacitação e Desenvolvimento, Aniele Xavier. “Acreditamos que discutir a temática do racismo estrutural é importante não só para a SJRJ, mas representa um valor fundamental que precisamos defender para a construção de uma sociedade mais justa e que vise à redução das desigualdades”, disse.

A SJRJ vem implantando uma série de medidas para o enfrentamento do racismo dentro da instituição. Em junho deste ano, a Direção do Foro aprovou o relatório final do Grupo de Trabalho sobre Igualdade Racial, criado em janeiro. O documento - inspirado no relatório "Igualdade Racial no Poder Judiciário", do CNJ - apresenta uma série de ações que objetivam superar a sub-representatividade dos profissionais negros e eliminar as desigualdades raciais dentro da instituição. As atividades do GT foram coordenadas pela juíza federal da 5ª. VF Criminal, dra. Adriana Cruz.

 

 

Assista aqui à gravação do webinário.