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Justiça Federal julga Lei de Anistia incompatível com a Convenção Americana de Direitos Humanos

Detalhe do Foro Desembargadora Federal Marilena Franco.  Abaixo, o seguinte título, em letras brancas: "Justiça Federal julga Lei de Anistia incompatível com a Convenção Americana de Direitos Humanos"
Justiça Federal julga Lei de Anistia incompatível com a Convenção Americana de Direitos Humanos

A Justiça Federal do Rio de Janeiro julgou que a Lei de Anistia (Lei 6.683/1979) viola a Convenção Americana de Direitos Humanos, e assim negou o arquivamento de três procedimentos investigatórios sobre crimes supostamente cometidos por agentes públicos durante a ditadura militar, no âmbito da perseguição política contra dissidentes do regime. Seguindo o entendimento da Corte Interamericana de Direitos Humanos, a 8ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro declarou que, à luz do direito internacional, são imprescritíveis os crimes que representem graves violações a direitos humanos.

As investigações cujos arquivamentos foram negados pela Justiça Federal versam sobre denúncias de torturas e maus tratos sofridas por Ana de Miranda Batista entre 1968 e 1974, do desaparecimento forçado de Joaquim Pires Cerveira em 1973, e de vários supostos crimes cometidos no âmbito da Operação Condor, de repressão a dissidentes políticos das ditaduras militares do Brasil e da Argentina.

O Ministério Público Federal havia pedido o arquivamento das investigações, argumentando que o Supremo Tribunal Federal considerou constitucional a Lei de Anistia (ADPF 153) e ainda não julgou a ADPF 320, que pede a declaração de invalidade da lei quanto a graves violações de direitos humanos. A Justiça Federal, porém, entendeu não ser necessário aguardar novo julgamento do STF, uma vez que a Corte Interamericana de Direitos Humanos tem entendimento firme pela invalidade da Lei de Anistia brasileira, à luz da Convenção Americana de Direitos Humanos (casos Gomes Lund v. Brasil, 2010, e Herzog v. Brasil, 2018), o que basta para a continuidade das investigações.

Segundo o juiz federal Frederico Montedonio Rego, é possível que uma lei seja considerada válida à luz da Constituição (controle de constitucionalidade), mas inválida à luz da Convenção Americana de Direitos Humanos (controle de convencionalidade). O próprio STF reconhece a validade superior dos tratados de direitos humanos em face das leis brasileiras, e assim decidiu, por exemplo, no julgamento que tratou da prisão civil do depositário infiel. Assim, o magistrado explica que não há contrariedade à decisão do STF na ADPF 153 – que analisou a validade da anistia à luz da Constituição –, mas de julgamento da lei segundo o parâmetro da Convenção Americana de Direitos Humanos. Afirma ainda o juiz que as investigações são exigidas pelo direito à verdade e à memória, também reconhecido no direito internacional, sob pena de possível responsabilização do Brasil por paralisia das investigações, como já ocorreu em outros casos.

Os casos seguem agora para a 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, órgão ao qual cabe a palavra final sobre o arquivamento ou não das investigações.

As decisões podem ser vistas em www.jfrj.jus.br, ou clicando no número do processo: 5054940-83.2022.4.02.5101, 5054888-87.2022.4.02.5101 e 5054980-65.2022.4.02.5101.