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Militares inativos devem ser julgados pela Justiça Comum, não pela Justiça Militar

martelo marrom (simbolizando a justiça)
Segundo a decisão, militares inativos devem ser julgados pela Justiça Comum

 

A Justiça Federal do Rio de Janeiro declarou a incompatibilidade do art. 9º, III, do Código Penal Militar com a Constituição de 1988 e com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica). O caso envolve a suposta prática de estelionato cometido por um militar reformado, durante a inatividade, contra o patrimônio da Marinha: embora diagnosticado com impossibilidade total e permanente para qualquer trabalho, ele estaria trabalhando e ao mesmo tempo continuaria recebendo proventos de inatividade por invalidez. Com base nos princípios do juiz natural e da igualdade de todos perante a lei, assim como em precedentes internacionais dos sistemas de proteção dos direitos humanos, a 8ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro afirmou que a jurisdição militar é excepcional e se restringe a crimes funcionais cometidos por militares da ativa, não por inativos (militares da reserva e reformados), que, para tais fins, são considerados civis.

Segundo a decisão do juiz federal Frederico Montedonio Rego, ao contrário do que ocorria nas Constituições anteriores desde 1934, a Constituição de 1988 deixou de prever a competência da Justiça Militar para julgar civis e “pessoas assemelhadas a militares”, sendo, portanto, inadmissíveis interpretações ampliativas do conceito de militar para fins de competência. A Justiça Militar é o único ramo do Judiciário em que não se exige formação jurídica da maioria de seus membros, mas, sim, que sejam eles mesmos militares da ativa. Essa circunstância já foi reconhecida pela Corte Interamericana de Direitos Humanos como incompatível com a imparcialidade exigida dos julgadores. No final de 2019, o mesmo magistrado já havia decidido pela impossibilidade do julgamento de civis pela Justiça Militar (processo 5038654-35.2019.4.02.5101 - clique aqui), tema que está pendente de decisão pelo STF (ADPF 289, Rel. Min. Gilmar Mendes). Segundo o juiz, o novo caso é uma variação do mesmo tema.

O juiz federal ainda discordou do arquivamento da investigação pelo Ministério Público Federal, que alegou que o militar não cometeu fraude porque não foi convocado pela Marinha para declarar que não exercia atividade remunerada. Segundo o magistrado, em tese, há silêncio doloso e fraudulento na conduta de quem exerce atividade remunerada ao mesmo tempo em que recebe proventos pelo diagnóstico de incapacidade para qualquer trabalho, independentemente de convocação prévia, na linha do mesmo entendimento aplicável quando fraudes semelhantes são cometidas contra o INSS. O caso agora segue para a 2ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, que pode confirmar o arquivamento ou determinar a continuidade das investigações.

Clique aqui para ler a decisão. O número do processo é mantido em sigilo.